sábado, 8 de setembro de 2012




Eu dei minha definição de ateísmo em um post aqui. Eu tenho que o ateísmo é sobretudo uma percepção anti-mística, o que engloba todo tipo de minifestação religiosa, mas que não se esgota nisso. As discussões focam, obviamente, nos aspectos mais estritos do que se discute, deus ocupando desproporcionalmente um espaço central. Mas há algo por demais localizado nesse embate entre ateísmo e religião. Sempre tenho a impressão de que, findo mais um round da discussão, todos voltam a seus afazeres e a seu dia-a-dia, e tudo isso acaba sendo muito parecido. Exceto talvez nos domingos, quando religiosos vão à missa e ateus fazem outra coisa qualquer. Quase como discutir sobre futebol, logo depois, nada muda muito nas vidas de quem discute, por mais disputado que tenha sido o jogo.
Isso sugere algumas coisas. Talvez, na vida atual, a religião ocupe um espaço cada vez mais restrito, mais íntimo. Pode ser que, em qquer caso, não faça muita diferença mesmo. Mas eu acho que não é bem assim. Minha opinião é que, se isso de fato ocorre, é porque poucos que se apresentam como ateus de fato sabem o que estão dizendo. Para além de acharem que crer em deus seria uma bobagem, a maioria segue uma série de padrões ou conceitos que são de origem religiosa, mas que acabaram ganhando uma espécie de vida própria. Não apenas seguem, como os usam como justificativa, exatamente como fariam seus amigos que vão à missa. Vão lá no jardim e tentam arrancar as plantas que julgam feias ou daninhas. Mas declarar-se ateu implica em passar um arado no jardim todo, e ter então que plantar tudo outra vez. Não importa se havia ali algumas plantinhas, flores ou árvores frutíferas, tudo é arrancado, jogado fora. E diante do terreno vazio e revirado, uma nova jardinagem começa.
Não há como ser meio ateu (nem meio religioso, diga-se). Mas o que então implica declarar-se ateu? Ou melhor, que consequências isso acarreta? Imediatemente, ser ateu implica em assumir que a vida não tem qualquer sentido objetivo. Ou seja, não há nenhum propósito maior a seguir. Outra consequência interessante é que caem por terra certas percepções muito comuns. Uma delas é a noção de dignidade humana, um conceito fortemente religioso. Esse conceito perde sua sustentação. Outra, é constatar que a vida humana não tem qualquer valor intrínseco, e muito menos qualquer valor absoluto. Não há qualquer justificativa para dizer a vida humana teria mais ou menos valor do que a vida um animal qualquer. Toda e qualquer convicção moral deve buscar alguma justificativa não mística, e isso significa dizer que virtualmente não há qualquer padrão externo ou maior para nos informar sobre o que é bom ou mau, certo ou errado. Implica em assmir que não há, na natureza, nada que nos ajude a decidir moralmente. Significa que todos os nossos hábitos, costumes e tradições devem ser recolocados em bases distintas. As noções de família e casamento devem ser justificadas – se é que devem – de outra forma. Nosso comportamento em nada difere, em termos de alguma pretensa superioridade, ao comportamente de animais. Significa reconhecer que somos animais, tão animais como qualquer outro que vemos no Animal Planet (isso, aliás, é a grande implicação moral do Darwninismo).
E então vem algo interessante. A reação imediata mais comum a tudo o que eu digo acima, imagino eu, é seguramente de reprovação ou mesmo uma espécie de horror. Talvez de indignação. Ou tudo isso junto. Mas eu acho que deveria ser uma reação de alívio, de leveza, de liberdade mesmo. Porque as constatações acima apenas geram reprovação em quem acredita que a natureza humana é intrinsecamente ruim, que ela precisa ser solapada, domada, sublimada. Que nós precisamos ser salvos (dessa natureza). Mas as constatações acima de modo algum implicam em seus contrários, digamos. Não é porque a vida não tem qualquer valor maior ou absoluto que ela será negligenciada. Ou que não haverá mais decisões morais tidas como certas ou erradas. Ao contrário.
Ser ateu implica, além daquilo que eu disse acima, em ter confiança e sem ser otimista e corajoso em relação à essência humana, e em acreditar e aceitar que, seja lá onde isso nos leve -  e por isso coragem – despegados de amarras absolutas,  místicas, perdidas no passado, isso será bom. Muito bom. Implica em ter confiança que esta é a verdedeira maneira de atingirmos o Jardim do Éden. Comendo maçãs à vontade, sem culpa.

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